Mulher viveu com doença rara por 18 anos, mas foi curada com remédios
Essa realidade é bem conhecida da americana Karen Byrne, de 55 anos, que sofre de uma condição rara chamada Síndrome da Mão Alheia.
A síndrome de Byrne é fascinante, não somente por ser tão estranha, mas, também, por ajudar a explicar algo surpreendente sobre como nossos cérebros funcionam.
O problema começou após ela passar por uma cirurgia, aos 27 anos, para controlar sua epilepsia, que havia dominado sua vida desde seus 10 anos de idade. A cirurgia para curar a epilepsia normalmente envolve identificar e depois cortar um pequeno pedaço do cérebro no qual os sinais elétricos anormais se originam.
Quando isso não funciona, ou quando a área danificada não pode ser identificada, os pacientes precisam passar por uma solução mais radical. No caso de Byrne, seu cirurgião cortou seu corpo caloso, um feixe de fibras nervosas que mantém os dois hemisférios do cérebro em permanente contato.
Novo problema
O corte do corpo caloso curou a epilepsia de Byrne, mas a deixou com um problema totalmente diferente. Ela conta que, inicialmente, tudo parecia bem, mas então os médicos começaram a notar um comportamento extremamente estranho.
- O médico me disse: 'Karen, o que você está fazendo? Sua mão está te despindo'. Até ele dizer isso, eu não tinha percebido que minha mão esquerda estava abrindo os botões da minha camisa. Então eu comecei a abotoar a camisa novamente com a mão direita, mas, assim que eu terminei, a mão esquerda começou a desabotoar de novo. Então o médico fez uma chamada de emergência para um outro médico e disse: 'Mike, você precisa vir aqui imediatamente, temos um problema'.
Karen Byrne havia saído da operação com uma mão esquerda que estava fora de controle.
- Eu acendia um cigarro, colocava-o no cinzeiro e então minha mão esquerda jogava-o fora. Ela tirava coisas da minha bolsa sem que eu percebesse. Perdi muitas coisas até que eu notasse o que estava acontecendo.
Em alguns casos, a mão esquerda dela chegava a estapeá-la, sem controle. Ela conta que seu rosto chegava a ficar inchado com tantos golpes.
Luta de poder
O problema de Byrne foi provocado por uma luta por poder dentro de sua cabeça. Um cérebro normal é formado por dois hemisférios que se comunicam entre si por meio do corpo caloso.
O hemisfério esquerdo, que controla o braço e a perna direitos, tende a ser onde residem as habilidades linguísticas. Já o hemisfério direito, que controla o braço e a perna esquerdos, é mais responsável pela localização espacial e pelo reconhecimento de padrões.
Normalmente, o hemisfério esquerdo, mais analítico, domina e tem a palavra final nas ações que desempenhamos. A descoberta do domínio hemisférico tem sua raiz nos anos 1940, quando os cirurgiões decidiram começar a tratar a epilepsia com o corte do corpo caloso.
Após a recuperação, os pacientes pareciam normais. Mas nos círculos psicológicos eles se tornaram lendas.
Isso porque esses pacientes revelariam, com o tempo, algo que parece incrível - que cada metade do nosso cérebro tem uma espécie de consciência separada. Cada hemisfério é capaz de ter sua própria vontade independente.
Experiências
O primeiro cientista que comprovou essa tese foi o neurobiólogo Roger Sperry. Em um estudo particularmente notável, que ele filmou, é possível ver um dos pacientes com o cérebro dividido tentando resolver um quebra-cabeça.
O quebra-cabeça exigia o rearranjo de blocos para que eles correspondessem a padrões em uma imagem.
Primeiro, o homem tentou resolver o quebra-cabeça com sua mão esquerda (controlada pelo hemisfério direito), com bastante sucesso.
Então Sperry pediu ao paciente que usasse sua mão direita (controlada pelo hemisfério esquerdo). Essa mão claramente não tinha nenhuma ideia de como fazê-lo.
A mão esquerda então tentou ajudar, mas a mão direita parecia não querer ajuda, então elas terminaram brigando como se fossem duas crianças.
Experiências como essa levaram Sperry a concluir que "cada hemisfério é um sistema de consciência isolado, percebendo, pensando, lembrando, raciocinando, querendo e se emocionando".
Em 1981, Sperry recebeu o prêmio Nobel por seu trabalho. Mas em uma ironia cruel do destino, ele então já sofria com uma doença degenerativa do cérebro, chamada kuru, provavelmente contraída em seus primeiros anos de pesquisas com cérebros.
Medicação
A maioria das pessoas que tiveram seus corpos calosos cortados parece normal posteriormente. Você poderia cruzar com eles na rua e não saberia que algo havia acontecido.
Karen Byrne teve azar. Após a operação, o lado direito de seu cérebro se recusava a ser dominado pelo lado esquerdo.
Ela sofreu com a Síndrome da Mão Alheia por 18 anos, mas, felizmente para ela, seus médicos encontraram uma medicação que parece ter trazido o lado direito de seu cérebro de volta ao controle.
A história de Byrne foi contada no último programa da série da BBC The Brain (O Cérebro), que foi ao ar no Reino Unido nesta quinta-feira (20).
0 comentários:
Postar um comentário