Uma pesquisa apresentada à Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) mostrou que os serviços de Unidades Básicas de Saúde destinam pouca atenção a homens adultos e não possuem atendimento voltado especificamente a eles. Além disso, as questões relacionadas à sexualidade masculina não são trabalhadas nessas unidades de atendimento, faltando discussão sobre o tema, assim como exames e programas de prevenção.
- De um lado, os próprios homens resistem a procurar os serviços de saúde; de outro, a expectativa dos profissionais de saúde de que o homem não vá procurar os serviços de atenção primária faz com que médicos, enfermeiros e outros atendentes se mostrem pouco preparados para recebê-lo e inseri-lo no cotidiano nos atendimentos - conta Thiago Félix Pinheiro, psicólogo e autor do estudo.
Segundo o pesquisador, a resistência dos homens está relacionada a valores culturais relacionados à virilidade, que já são parte de um modelo de masculinidade.
A pesquisa, feita na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, consistiu na realização de 57 entrevistas com homens entre 16 e 68 anos que frequentavam serviços de atendimento primário e na observação e análise desses locais de atendimento, desde sala de espera e consultas dos pacientes até os momentos de intervalo dos profissionais. Notou-se, então, que há uma superficialidade no tratamento dado.
- As demandas dos pacientes são tratadas em termos essencialmente fisiopatológicos, em um discurso medicalizado -, diz Pinheiro, que explica que os aspectos psicológico e social do homem não são pensados nesse tipo de abordagem.
- Se ele tem um problema relacionado à ereção, por exemplo, os profissionais se atêm a pensar que há uma falha orgânica ou que o problema está sendo causado por alguma medicação que o paciente está tomando - ressalta.
A postura adotada pelos profissionais em situações de constrangimento também é vista pelo pesquisador como um problema.
- Alguns profissionais defendem que não há motivo para receio na realização de um exame de próstata, por exemplo, por ser uma intervenção estritamente profissional, e desconsideram, assim, que o procedimento do toque retal interfere em representações ligadas à masculinidade - diz o psicólogo.
Ele afirma que essa situação agrava ainda mais a dificuldade de aproximação do paciente. A situação se transforma em um ciclo, agravando o despreparo das duas partes e fazendo com que o homem permaneça ainda mais afastado do contexto da saúde pública.
Observando as consultas, Pinheiro percebeu uma grande diferenciação nos tratamentos ao homem e à mulher em relação à sexualidade: enquanto grupos de discussão e atividades de prevenção integram a agenda de pacientes do sexo feminino que vão ao serviço de atenção primária, não há atividade alguma para os homens.
- A distribuição de camisinhas nas unidades de saúde deixa isso muito claro: enquanto a mulher recebe uma série de orientações sobre o uso do preservativo nos grupos de planejamento familiar, o homem simplesmente pede e retira a camisinha na farmácia das unidades. Alguns profissionais partem do pressuposto de que o homem não tem dúvidas nem questões a respeito do preservativo - revela.
O psicólogo diz que, nesse sentido, a rotulação da sexualidade masculina como algo impulsivo fortalece a disparidade entre os tratamentos.
Outra diferença notada pelo pesquisador foi a de que boa parte das demandas em sexualidade masculina não são consideradas alçada das Unidades Básicas de Saúde e sim da assistência especializada.
- Nas unidades básicas, uma mulher pode realizar consulta ginecológica para diagnóstico precoce de DST. Quando identificado, esse problema é tratado no próprio local e ela é responsabilizada pelo tratamento do parceiro. Já no caso do homem, não há um atendimento específico para tais questões. Quando ele apresenta uma DST, por exemplo, é encaminhado para serviços especializados em outros lugares, o que implica uma nova espera para marcar outra consulta e enfrentar outras filas. Isso novamente o desestimula a procurar serviços de saúde - afirma o pesquisador
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